Tintoretto

Tintoretto
   

Jacopo Robusti nasceu em Veneza, no outono de 1518. Seu pai era tintureiro, tintore em italiano, o menino ficou conhecido como Tintoretto. Jacopo permaneceu fiel à sua ilha natal por toda sua vida, tendo de lá saído apenas uma vez, no ano de 1580.

Conta-se que, desde muito pequeno, o filho do tintureiro demonstrava possuir aptidões artísticas, cobrindo as paredes da casa com muitos desenhos. Quando adolescente, seu pai o enviou ao estúdio de Ticiano, na época o centro artístico de Veneza. Seu aprendizado com o grande mestre seria, entretanto, muito curto, tendo durado apenas poucos dias. Diz a lenda que o velho pintor sentiu-se ameaçado e enciumado diante do talento do artista precoce e, além disso, não podia suportar seu gênio intragável. De qualquer maneira, Tintoretto logo começou a se sustentar como artista.

Na época em que completou 21 anos. Tintoretto se estabeleceu como mestre independente em seu próprio estúdio. Durante os cinco anos seguintes assistiu a muitas mudanças importantes na arte veneziana. O estilo novo dos maneiristas italiano foi se tornando mais conhecido, assim como a obra de Michelangelo. Ticiano também, nessa época, passou por uma crise que mudou seu estilo de maneira dramática. Enquanto isso, Tintoretto explorava e experimentava, buscando um estilo artístico que captasse e traduzisse sua visão pessoal.

Em direção a um novo estilo

Em 1545, Tintoretto executou duas pinturas para o professor Aretino, ambas sobre temas mitológicos da Grécia Antiga. Aretino escreveu a Tintoretto parabenizando-0, mas também o criticou pela pressa e pela aparente falta de acabamento das telas. Tal crítica seria repetida ainda muitas vezes durante sua vida, e também após sua morte.

O temperamento alegre e por vezes indecente de Aretino, que era amigo íntimo de Ticiano, opunha-se ao recato introspectivo de Tintoretto. As tranquilas cenas de mitologia que tanto chamavam a atenção das novas gerações de artistas venezianos, como por exemplo Giorgione, são pouco frequentes na obra de Tintoretto, que é predominantemente religiosa nos temas e, por vezes, de estilo violento e atormentado.

Em 1548, Tintoretto completou a tela que lhe traria fama: São Marcos Salvando um Escravo. Esta pintura, de cores brilhantes e textura densa, chocou muita gente, inclusive Ticiano, que criticou a excessiva virtuosidade do autor. Mas essa obra anunciava a força de um estilo arrojado e extremamente original. com essa pintura, Tintoretto se firmou entre os primeiros artistas venezianos.

Casamento feliz

Em 1550, casou-se co Faustina dei Vescovi, uma jovem bonita, inteligente, com um belo dote, e que além de tudo revelava aptidão para assuntos financeiros. Diz-se que foi um casamento feliz, e dois de seus filhos tornaram-se pintores também. Entre esses, Domenico foi seu assistente e continuou o estúdio de Tintoretto após sua morte, permanecendo fiel ao estilo do pai. Também sua filha Marietta teria se disfarçado em rapaz para poder trabalhar junto com o pai nas grandes empreitadas dentro do Palácio do Doge de Veneza.

Este homem bem-casado passava a maior parte de seu tempo trabalhando no estúdio. O crítico Giorgio Vasari conta que “Tintoretto vivia distante das futilidades, em vista do volume de trabalho e das preocupações a que estava sujeito para desenvolver e aprimorar seu estilo. (…) Dificilmente permitia a entrada de criados no estúdio, nem mesmo os amigos, quanto mais outros artistas”. De qualquer maneira, Tintoretto fez muitas amizades com diversos artistas, inclusive Paolo Veronese, Jacopo Bassano e o escultor Alessandro Vittoria. Até o final da década de 1550, completou a magnífica Apresentação da Virgem, para a Paróquia da Madona dell’Orto, onde permanece até hoje.

Motivo de controvérsias

Nessa ocasião, Tintoretto já era famoso por sua figura controvertida, não apenas por sua personalidade, que Vasari descreveu como agradável, mas principalmente pela natureza turbulenta de sua arte. Num guia sobre Veneza, publicado em 1556, o autor menciona Tintoretto como um dos artistas expoentes da República, porém critica a “maneira apressada de sua obra que revela genialidade”.

Em 1564, Tintoretto começou a trabalhar em  seu maior projeto, a decoração da  Escola de São Roque, uma das muitas instituições de cunho religioso que existiam em Veneza. A escola havia terminado a construção de sua nova sede e anunciara a concorrência para a pintura do teto, que deveria ostentar seu santo padroeiro. Os artistas de Veneza foram convidados a apresentar projetos preliminares. Tintoretto descobriu as exatas dimensões dos espaços a serem preenchidos, e não se contentou em realizar um estudo preliminar. Apresentou a pintura terminada, que ele mesmo, em segredo, instalou na Escola, um dia antes da apresentação dos trabalhos. Em seguida, anunciou, para surpresa dos membros da Escola, que a pintura era um presente ao santo, e que, por esse motivo e de acordo com os regulamentos da instituição, não poderia ser recusada.

Outros artistas não se deixaram impressionar com essa jogada, mas isso marcou o início de uma associação de vinte e cinco anos entre a Escola e Tintoretto, que traria fama duradoura a ambos. No ano seguinte, Tintoretto se tornou membro da Escola, uma rara distinção para um artista, e decidiu decorar a Sala dell’Albergo, no andar superior. Essa obra, que inclui a monumental A Crucificação, foi terminada durante os três anos seguintes. Nessa época, Tintoretto contratara muitos assistentes, inclusive seus filhos Domenico e Marietta. Muitas encomendas que recebia foram executadas por eles sob suas ordens. Durante alguns anos o artista dedicou-se exclusivamente aso trabalhos na Escola de São Roque, que estão entre as mais belas e pessoais realizações do artista.

E, 1570, Veneza e seus aliados venceram os turcos na Batalha de Lepanto. O Governo realizou uma concorrência para que fosse pintado um quadro comemorativo do evento, que ficaria no Palácio do Doge, centro político de Veneza. Tintoretto conseguiu vencer o concurso, oferecendo-se para executar o quadro de graça e comprometendo-se a terminá-lo dentro do prazo de um ano. Tempos depois, todavia, reclamou que deveria receber como pagamento o dinheiro resultante de uma corretagem no Fondaco dei Tedeschi ( o mercado de trocas dos alemães). Afinal, Tintoretto tinha filhos para sustentar e precisava de um salário fixo. Mas infelizmente nunca recebeu esse dinheiro.

Tintoretto trabalhava regularmente no Palácio do Doge e, em 1574, foi apresentado como uma das pessoas mais importantes da cidade ao Rei da França, Henrique III, que visitava Veneza. Naquele mesmo ano, com ajuda de seu sogro, comprou o Palazzo del Cammello, um pequeno edifício medieval, perto da Paróquia da Madonna dell’Orto. A casa abrigaria sua família e seu estúdio até o fim de sua vida e permaneceu de posse de suas descendentes até o ano de 1835.

A morte de Ticiano

Em 1575, Veneza foi atacada pela peste. Em dois anos a doença dizimou mais de 50.000 pessoas, entre elas o ancião Ticiano. Após sua morte. Tintoretto conseguiu comprar A Coroação de Espinhos, hoje em Munque, comprovando que a antiga rivalidade entre os dois terminava respeitosamente naquele momento.

Nessa época, as relíquias de São Roque, santo padroeiro das vítimas da peste, se espalhavam pela cidade. Logo depois a epidemia chegaria ao fim. Isso contribuiu não apenas para um novo impulso no culto do santo, mas também ao fervor religioso em geral. Na ocasião, Tintoretto estava encarregado de decorar o piso superior da Escola de São Roque, tarefa que lhe custou cinco anos de trabalho. Em 1577, na metade do trabalho, assinou um acordo com os diretores da Escola, estipulando que ele terminaria a decoração do prédio em troca de uma anuidade de 100 ducados, que foi prontamente aceita e paga regularmente, ao contrário do que ocorria com sua pensão do governo republicano.

Obras-primas destruídas

Infelizmente, naquele mesmo ano, uma séria de obras famosas de Tintoretto, incluindo a Batalha de Levanto, foi destruída num incêndio que ocorreu no Palácio do Doge. Veronese e Tintoretto foram indicados para redecorar o prédio reconstruído.

Em 1580, Tintoretto realizou sua única viagem para fora de Veneza. Foi com a mulher e os filhos a Mântua, para fazer a entrega de uma obra que o duque da cidade lhe havia encomendado.

Em 1582, Tintoretto começou a fase final de sua obra em São Roque: a decoração a entrada inferior, à qual imprimiu, com a mais completa expressão, um estilo etéreo, característico desse estágio de sua carreira. Quatro anos mais tarde conseguiu terminar, finalmente o ciclo de pinturas e o sacrário. Essas obras permanecem até hoje no mesmo local, sendo consideradas o maior monumento do artista.

Em 1588, Veronese morreu. Estava, então comprometido com uma encomenda de uma gigantesca pintura do Paraíso para a Câmara Superior no recém-construído Palácio do Doge. Essa tarefa acabou por recair sobre os ombros de Tintoretto, custando-lhe muitos anos de trabalho, inclusive com a colaboração de muitos assistentes. A Coroação de Virgem, conhecida como Paraíso é um dos maiores quadros a óleo do mundo. Embora não esteja incluído entre suas melhores obras, é um feito notável por sua composição e pelo estilo inovador.

Golpe doloroso

Em 1590, logo após o término do Paraíso, a bem-amada, filha de Tintoretto, Marietta, morreu, aos 34 anos. O velho pintor abalou-se profundamente, passando muito tempo em conversas com os irmãos da Madonna dell’Orto, distanciando-se da tarefa de dirigir o famoso estúdio, que passou para o controle do filho Domenico. Entretanto, seus dotes artísticos não tinham se esgotado. Suas três últimas obras-primas decoram a recém-terminada Igreja de São Jorge Maior, em Veneza, incluindo uma maravilhosa A Última Ceia, repleta de misticismo e clima visionário.

O inverno de 1593 foi muito rigoroso em Veneza, e até mesmo as águas dos canais se congelaram. Tintoretto começou a ter problemas de estômago, o que o enfraqueceu. Sem conseguir comer e dormir por quinze dias seguidos. Tintoretto morreu em sua casa, no Palazzo del Cammello, no dia 31 de maio de 1594.

Um comentário em “Tintoretto”.

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  1. As chamadas Belas Artes, seja qual for a classificação de seu gênero ou estilo, são expressões singulares do gênio e dos dons que estão n’alma de cada pintor, de cada escultor… Com efeito, a genialidade que transparece de uma Tela de TINTORETTO ou de DA VINCI determina o teor das aquisições espirituais dos seus autores através de suas vidas sucessivas. (Faço este comentário, é óbvio, de acordo com as minhas convicções doutrinárias-filosóficas; eu sou espírita, aliás, eu nasci espírita.)

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