José Leonilson Bezerra Dias nasceu no ano de 1957 em Fortaleza, Ceará.
Refinada escrita poética, cores e traços delicados, bordados frágeis, objetos do próprio cotidiano e elementos gráficos fazem da obra do artista plástico Leonilson uma extensa produção autobiográfica, que expõe os dramas e as angustias do homem contemporâneo.
Em 1961, muda-se com a família para São Paulo.
Entre 1977 e 1980, cursa educação artística na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), onde é aluno de Julio Plaza (1938-2003), Nelson Leirner (1932).
Tem aulas de aquarela com Dudi Maia Rosa (1946) na escola de artes Aster, que frequenta de 1978 a 1981.
Nesse último ano, em Madri, realiza sua primeira individual na galeria Casa do Brasil e viaja para outras cidades da Europa.
Em Milão tem contato com Antonio Dias (1944), que o apresenta ao crítico de arte ligado à transvanguarda italiana Achille Bonito Oliva (1939).
Retorna ao Brasil em 1982.
A obra de Leonilson é predominantemente autobiográfica e está concentrada nos últimos dez anos de sua vida.
Segundo a crítica Lisette Lagnado, cada peça realizada pelo artista é construída como uma carta para um diário íntimo.
Em 1989, começa a fazer uso de costuras e bordados, que passam a ser recorrentes em sua produção.
Em 1991, descobre ser portador do vírus da Aids e a condição de doente repercute de forma dominante em sua obra.
Seu último trabalho, uma instalação concebida para a Capela do Morumbi, em São Paulo, em 1993, tem um sentido espiritual e alude à fragilidade da vida.
Por essa mostra e por outra individual realizada no mesmo ano, recebe, em 1994, homenagem póstuma e prêmio da Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA).
No mesmo ano de sua morte, familiares e amigos fundam o Projeto Leonilson, com o objetivo de organizar os arquivos do artista e de pesquisar, catalogar e divulgar suas obras.
Para a crítica Lisette Lagnado, o artista foi movido pela necessidade de registrar sua subjetividade.
A princípio, sua obra aproxima-se da visualidade dos trabalhos de Antonio Dias, porém com mais potência erótica.
As formas nos desenhos são envoltas por um contorno escuro, como no grafite norte-americano.
Em paralelo, começa a elaborar elementos que são permanentemente retomados até o fim de sua vida: o livro aberto, a torre, o radar, o átomo, o coração, a espiral, o relógio, a bússola e a ampulheta, entre outros.
Em 1989, expõe Anotações de Viagem na Galeria Luisa Strina, em São Paulo, apresentando peças feitas com botões, pedras semipreciosas e bordados, que introduzem um novo e fundamental procedimento em seu trabalho: a costura.
As peças sugerem correspondência com os bordados de Arthur Bispo do Rosário (1911-1989), que Leonilson admirava.
Entretanto, o universo da costura lhe é familiar, por ser filho de um comerciante de tecidos e ter também o hábito de ver a mãe bordar.
Para Lagnado, além destes dados há em sua obra certas similitudes com o modo de vida dos shakers, membros de seita religiosa norte-americana, como o uso marcante de mapas ou o costume de bordar a roupa de cama com iniciais ou números.
Na constituição de uma expressão pessoal e subjetiva, desde 1984, Leonilson realiza formas orgânicas em seus desenhos e pinturas, que se aproximam cada vez mais de cartografias do corpo.
Toma também consciência da necessidade de constituir com as palavras uma linguagem própria, tema de O Pescador de Palavras (1986).
Nas obras Sua Montanha Interior Protetora (1989) e Oceano, Aceita-Me? (1991) aparece a visão da natureza incomensurável, como o abismo, o vulcão, a corredeira com pedras, o oceano.
A postura romântica do artista é revelada também na pintura O Inconformado (1988), na qual um personagem é representado dentro de um carro em que não cabe, devido a suas proporções desmedidas, e em Leo não Consegue Mudar o Mundo (1989), em que o inconformismo se liga à impotência.
Sua produção começa a sofrer, então, um despojamento formal, mas o conteúdo não muda: usa palavras carregadas de valor moral como “sinceridade”, “honestidade” e “integridade”.
Por outro lado, as palavras servem para manifestação de estados íntimos: “alegre”, “tímido”, “solitário”, “hipócrita”, “deslocado”, “cheio e vazio”, “cético”, “ansioso” ou “confuso”.
Em O Perigoso (1992), série de sete desenhos, trata com ironia a própria condição de soropositivo.
No primeiro desenho, há uma gota do seu sangue, contaminado.
Nos outros, pequenas figuras de mãos associadas a procedimentos médicos ou crucifixos são mescladas a diversas palavras, como nomes de flores, adquirindo uma dimensão alegórica relacionada à simbologia cristã da pureza e da morte.
Alguns trabalhos desta fase podem ser vistos como auto-retratos.
Por exemplo, em El Puerto (1992), um espelho coberto com retalho de uma camisa do artista contém, bordadas com linha azul, informações sobre sua idade, peso e altura.
É uma obra que versa sobre o luto e a ausência da figura.
A instalação na Capela do Morumbi, de 1993, seu último trabalho, tem um sentido espiritual.
Nos tecidos leves e brancos expressa a fragilidade da vida.
Há referências irônicas à autoridade e à hipocrisia, nas camisas moles que revestem as cadeiras e nos bordados “da falsa moral” e “do bom coração”, mas também à esperança, em “Lázaro”.
A obra de Leonilson, ao voltar-se para o corpo do artista, aproxima-se dos trabalhos de Louise Bourgeois (1911-2010), Eva Hesse (1936-1970), Lygia Clark (1920-1988) e Hélio Oiticica (1937-1980), entre outros, e tem ressonância na produção artística mais recente, como nos trabalhos de Efrain Almeida (1964) e Sandra Cinto (1968), que lidam com uma linguagem igualmente intimista.
Leonilson faleceu no ano de 1993 em São Paulo – SP.