Este quadro reproduz um tema de devoção bastante tradicional. Trata-se de Verrocchio, um dos pintores e bronzistas florentinos mais afamados do último terço do século 15. Leonardo da Vinci fazia parte, naquela altura, da oficina do seu mestre. Na qualidade de aprendiz, pinta o anjo da esquerda e a matizada paisagem do fundo. Apesar da juventude do artista, o seu trabalho pode ser apreciado, sendo completamente diferente do conjunto da obra. Esta caracteriza-se pelo predomínio do desenho, cores planas e figuras monumentais escultóricas.
Vasari conta um presumível episódio, no qual o mestre Verrochio não voltou a pintar, sentindo-se humilhado, ao constatar a perícia demonstrada pelo seu discípulo neste quadro.
O que é verdadeiramente interessante na obra é o contraste que se produz entre a zona pintada pelo aprendiz Leonardo e o resto do quadro, pintado pelo mestre. Verrocchio concebe uma pintura plena de gravidade, segundo os cânones da época. A solenidade do momento incrementa-se com figuras monumentais, de aspecto escultórico.
A linha é um elemento técnico decisivo. Perante essa sobriedade, o artista opta por representar um anjo extraordinariamente delicado e de rosto ambíguo.
A paisagem do fundo está suavemente matizada por uma atmosfera irreal. Uma luz arbitrária incide sobre a superfície da tela, graduando formas e cores. O desenho tem ainda o papel mais importante que posteriormente cede ao sfumato e ao claro-escuro.
O quadro obedece a duas linguagens estéticas diferentes: uma que começa a se extinguir e que se baseia no predomínio absoluto do desenho. A linha e as cores planas perdem terreno pouco a pouco a favor de uma visão diferente, simbolizada no anjo localizado na margem direita da tela e na paisagem do fundo.
Verrocchio era também escultor, isto determina a sua concepção da figura dentro do quadro. Leonardo cria uma forma de entender a arte pictórica radicalmente oposta à de Verrocchio. A luz e as sombras servem-lhe para modelar volumes e matizar tonalidades. As figuras encontram-se integradas num âmbito espacial contínuo, também coberto por uma densa atmosfera, cheia de idealização.
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