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Vincent Van Gogh, escritor

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Conhecido como pintor, Van Gogh deixa inúmeras cartas nas quais coloca sua opinião clara e repleta de conhecimento literário. E Vincent não se restringia a escrever, ele pensava sobre literatura.

Na correspondência com Emile Bernard, o pintor se arriscava como poeta, demonstra sua lúcida habilidade em avaliar textos. A pintura de Van Gogh está ligada, numa comunhão perene, à obra escrita que ele nos legou através das suas cartas. Uma complementa a outra.

Daí sua fama e sua história precederem e predominarem sobre a arte que ele produziu.

Não foi à toa que o perfil mais visceral de Van Gogh foi desenhado por um escritor francês que nos deixou o manifesto intitulado Van Gogh, o suicida da sociedade, de Antonin Artaud:

“Não, Van Gogh não era louco, mas suas pinturas eram bombas atômicas, cujo ângulo de visão, ao lado de todas as outras pinturas polêmicas da época, foi capaz de abalar gravemente o conformismo larvar da burguesia…”

“E o que é um autêntico alienado?

É um homem que preferiu torna-se louco, no sentido em que isso é socialmente entendido, a conspurcar uma certa ideia superior da honra humana.

Foi assim que a sociedade estrangulou em seus asilos todos aqueles dos quais ela quis se livrar ou se proteger por terem se recusado a se tornar cúmplices dela em algumas grandes safadezas.

Porque o alienado é também o homem que a sociedade se negou a ouvir e quis impedi-lo de dizer insuportáveis verdades.”

“Há em todo demente um gênio incompreendido em cuja mente brilha uma ideia assustadora e que só no delírio consegue encontrar uma saída para as coerções que a vida lhe preparou.”

Atormentado por amores obsessivos, do famoso caso em que decepa a própria orelha para entregar a uma prostituta, dos acessos de fúria, dos mergulhos profundos na melancolia.

Tudo em torno de Van Gogh o rotulava como louco, mas as suas maiores predileções literárias espelhavam um homem romântico e voltado para a razão.

Era um pintor que valorizava a palavra, conforme revela ao amigo Emile Bernard em uma de suas cartas:

“Há tanta gente, especialmente entre nossos camaradas, que imagina que as palavras não significam nada – pelo contrário, a verdade é que dizer uma coisa bem é tão interessante e difícil quanto pintá-la.

Há a arte das linhas e das cores, mas também existe a arte das palavras, e esta permanecerá.”

“Um homem pode ter uma soberba orquestração de cores e não ter ideias.”

A admiração incondicional de Van Gogh por Emile Zola demonstra o fascínio que o racionalismo científico lhe causava.

Zola é citado incontáveis vezes em suas correspondências.

“Chegando à França como um estrangeiro, eu, talvez melhor do que os franceses nascidos e criados aqui, senti o que havia em Delacroix e em Zola; e a minha admiração sincera e total por eles não conhece limites.”

“Em sua qualidade de pintores de uma sociedade, de uma natureza tomada em sua plenitude, assim como Zola e Balzac, produzem raras emoções artísticas naqueles que os amam, justamente porque eles abrangem a totalidade da época que descrevem.”

Vincent exprimia muitos elogios aos autores franceses, principalmente os do século 19, com exceção de Baudelaire, por quem nutria certa implicância por ter criticado pintores que ele idolatrava.

“Vamos tomar Baudelaire por aquilo que ele realmente é: um poeta moderno, do mesmo modo que Musset, mas que ele deixe de se meter a falar de pintura.”

Em uma das cartas comenta que estudou um dos livros de Víctor Hugo: O último dia de um condenado, um manifesto contra a pena de morte que suscitou enorme repercussão ao ser publicado.

Há trechos em ele faz referências a Guy de Maupassant.

Lia historiadores, como Jules Michelet, para conhecer a história da Revolução Francesa.

Mas Van Gogh não deixava de praticar algum ecletismo literário quando fala das suas leituras de Shakespeare, Charles Dickens, Beecher Stowe, Ésquilo, da bíblia e dos evangelhos.

“Meu Deus, como é belo Shakespeare.

Quem é misterioso como ele?

Suas palavras e sua maneira de fazer equivalem a um pincel fremente de febre e emoção.

Mas é preciso aprender a ler, como é preciso aprender a ver e aprender a viver” (Van Gogh em Cartas a Theo).

Van Gogh escreveu uma das mais belas sentenças que podemos encontrar sobre a nossa humanidade em qualquer literatura.

“Eu também gostaria de saber aproximadamente o que é que eu sou. Talvez eu seja a larva de mim mesmo” (carta a Emile Bernard).

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