Autorretrato, Os Miseráveis, 18881
De uma carta de Paul Gauguin a Émile Schuffenecker, Quimperlé, 8 de outubro de 1888.
“Este ano sacrifiquei tudo, a execução, a cor, pelo estilo, no desejo de me impor algo diferente do que sei fazer.
Creio que é uma transformação que não deu ainda seus frutos, mas que os dará.
Fiz um retrato meu para Vincent, que me havia pedido.
Acho que é uma das minhas melhores coisas: absolutamente incompreensível (por exemplo), de tão abstrato.
À primeira vista, cara de bandido, de Jean Valjean (Os Miseráveis), personificando também um pintor impressionista desconsiderado, carregando sempre uma cadeia para o mundo.
O desenho é absolutamente especial, abstração completa.
Os olhos, a boca, o nariz são como flores de tapete persa, personificando também o lado simbólico.
A cor é uma cor distante da natureza; imagine uma vaga lembrança da cerâmica deformada pelo grande fogo!
Todos os vermelhos, os violetas, riscados pelos clarões de fogo como uma fornalha brilhando nos olhos, sede das lutas do pensamento do pintor.
Tudo isso sobre um fundo como salpicado de buquês infantis.
Quarto de jovem pura.
O impressionista é um puro, ainda não maculado pelo beijo podre da Écoles des Beaux-Arts.”
Este quadro foi resultado de um pedido de Van Gogh, para que tanto Gauguin como Bernard, que estavam em Pont-Aven, pintassem seus respectivos retratos e os mandassem para Arles.
Nenhum dos pintores foi capaz, por diferentes razões, de pintar o rosto do outro, e resolveram fazer autorretratos, que incluíram um esbolo do outro, no fundo.
Gauguin fez uma observação adicional numa carta a Van Gogh, de que “ao pintá-lo ( Jean Valjean) à minha semelhança, você terá uma magem de mim mesmo, bem como um retrato de todos nós, pobres vitimas da sociedade, que só retaliamos fazendo o bem.” De uma carta inédita em poder de Ir.V.W. van Gogh)
A obra em questão faz parte da Coleção A. Conger Goodyear, Nova York