Esta mostra apresenta uma seleção das obras adquiridas pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo nos últimos cinco anos.
As aquisições foram feitas por meio de doações de particulares, várias das quais mediadas pelo programa de associados do museu chamado Núcleo Contemporâneo.
As obras aqui reunidas indicam linhas de força da coleção do MAM.
A relação histórica do museu com a abstração geométrica no Brasil está representada pelo desenho de Lothar Charoux, de 1958, a peça mais antiga da mostra.
A posterior politização do rigor geométrico durante a década de 1960 evidencia-se no projeto de livro de artista de Julio Plaza, pois o público é convidado a abandonar a posição de espectador passivo de uma ordem única para virar livremente as páginas coloridas.
Por outro lado, o uso mais lírico da geometria também subsiste até os anos 1980, como testemunha a tapeçaria de Jacques Douchez.
Além de pensar a própria história, o museu deve também refletir sobre os mitos do país.
Nossa capital, Brasília, é a mais monumental obra do desenho geométrico abstrato aplicado à arquitetura e ao urbanismo, aparecendo como cenário do velório de Oscar Niemeyer, na foto de Mauro Restiffe: a utopia do empreendimento mítico que iria mudar o Brasil e a finitude de Brasília encontram-se num momento único.
Outra invenção do imaginário brasileiro aparece nas palavras de Gilberto Freyre, criador do mito da democracia racial brasileira: Jonathas de Andrade organiza geometricamente as expressões de Freyre, entre fotos estereotipadas da preguiça do trabalhador negro.
Mas o encontro positivo entre a geometria abstrata e a materialidade simbólica da mitologia afro-brasileira afirma-se na obra de Mestre Didi.
A relação entre geometria e poder continua pelo núcleo de poetas visuais dos anos 1970: Almandrade e Ridyas.
Num mundo cada vez mais interligado pela indústria da comunicação de massa, ambos buscam frestas de liberdade entre linhas e colunas.
A paisagem é também um aspecto relevante da coleção.
Estando no parque Ibirapuera, o MAM relaciona-se de modo privilegiado com o paisagismo moderno.
Nas paisagens aqui reunidas, a racionalidade característica da geometria manifesta-se, seja em formas que se repetem, como nas fotos de Marcelo Moscheta, seja por meio da escolha ponderada dos materiais de pintura, como no quadro de Rodrigo Andrade, seja na composição de quadriláteros que se reforçam, como no céu de Sandra Cinto.
Por outro lado, a coleção inclui obras que se opõem à racionalidade.
O quadro de avaf usa os elementos da geometria e a sobriedade do vermelho com preto para chegar a uma construção anárquica.
O painel de Laura Lima registra a destruição da malha geométrica, pois é desfiado aleatoriamente e amarrado grosseiramente à própria estrutura.
A composição de imagens de João Castilho mobiliza retângulos predominantemente azuis para criar uma narrativa fragmentada.
A cidade de Montez Magno usa a aleatoriedade dos dados para desafiar o planejamento urbano.
A foto de Erika Verzutti e Luiz Roque cria um desconcertante jogo de cheios e vazios, no qual sombras tomam o lugar de pessoas e uma enorme jaca ocupa o lugar do intervalo que as separa.
A série O jardim, de Pedro David, mostra um mundo árido, onde os vestígios de queimadas e de construções inúteis sobrevivem aos esforços de dominação humana.
O engajamento artístico na história política do Brasil, por sua vez, é representado pelo quadro Luta, de José Roberto Aguilar, feito em 1967, e pela série de fotos do coletivo 3NÓS3 intitulada Ensacamento, registrando ações de cobrir estátuas públicas com sacos que simulam a tortura, realizadas em 1979.
Felipe Chaimovich, curador
Museu de Arte Moderna de São Paulo. Avenida Pedro Álvares Cabral, s/nº – Portões 1 e 3 – Parque Ibirapuera – São Paulo – SP. Aberto de terça a domingo, das 10h às 17h30. Entrada gratuita aos sábados. Até 31/03/19.
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