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O mistério do roubo da Mona Lisa

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“A famosa obra do Renascimento foi roubada em 1911 do Louvre, sem nenhuma pista significativa.

No Louvre, franceses enlutados depositam buquês de flores diante da parede nua.

A obra de 400 anos, pintada sobre uma placa de madeira choupo-branco lombardo, com 77cm por 53cm de Leonardo da Vinci, ainda não se tinha sinal dela.

Em dezembro de 1913, o marchand florentino Alfredo Geri recebe uma carta.

O senhor corpulento, de ombros largos e muito sociável, abastece a classe alta florentina com sua loja de antiguidades na Via Borgo Ognissanti.

Seria verdade ou a carta de um louco?

Lê mais uma vez: ‘Tenho em minha posse a obra roubada de Leonardo da Vinci. Pertence à Itália, isso é claro, já que o pintor era italiano. Meu desejo é devolver esta obra prima ao país de onde veio e pelo qual foi inspirada. Leonardo.’

Geri consegue, então, combinar por carta para 22 de dezembro, em Milão, um encontro com o sinistro remetente ‘Leonardo’.

Mas em 10 de dezembro, quando Geri vai fechar a loja, às sete e meia da noite, apresenta-se um senhor antes misturado aos últimos visitantes.

‘Meu nome é Leonardo’.

Geri olha pasmo para o homem: Tem uma tez escura, cabelo preto com brilhantina, parecendo um pouco oleoso no geral, com um bigode enrolado.

Diz ter chegado um pouco mais cedo e se alojado, sob o nome ‘Leonardo Vincenzo’, no Albergo Trípoli-Itália, na Via Panzani.

Só um quarteirão, então, da aldeia San Lorenzo, onde Lisa del Giocondo posou como modelo para Leonardo quatrocentos anos antes.

No dia seguinte, às quinze horas, diz Leonardo, o signore Geri poderia contemplar a Mona Lisa na pensão.

Geri alerta o diretor da Galeria Uffizi, Giovannni Poggi, e os três seguem do antiquário para a pensão arruinada.

Caminhando pela rua, Geri e Leonardo chegam a um acordo, segundo o qual este último ganhará 500 mil liras se o quadro for verdadeiro.

É muito gentil, diz Leonardo, mas para ele o dinheiro não é importante, quer apenas devolver à Itália um tesouro roubado.

Poggi e Geri se entreolham confusos.

Os senhores sobem a escada íngreme do Albergo Tripoli-Itália, onde no segundo andar fica o surrado quarto individual de Leonardo.

Este tira uma mala de baixo da cama e joga sobre ela o conteúdo inteiro: roupas debaixo, ferramentas e instrumentos de barbear.

Depois abre uma dupla divisória da mala e segura na mão uma tábua envolta em seda vermelha:

‘Diante de nossos olhos apareceu a Gioconda, intacta e maravilhosamente conservada. Levamos a pintura até a janela para compará-la com uma foto que trouxemos. Poggi cuidou de examiná-la’, contou o comerciante Geri mais tarde.

Não restam dúvidas, no verso está o número de inventário do Louvre.

Apesar da excitação, todavia, Geri e Poggi controlam os nervos – dizem a Leonardo que seu quadro parece ser o procurado, mas teriam de aprofundar a investigação.

Exausto da longa viagem e com a perspectiva de ganhar 500 mil liras, Leonardo encosta o quadro na parede e deita-se para uma sesta.

Poggi chama imediatamente a polícia – quando os carabinieri abrem a porta Leonardo ainda dorme, e, ao lado da cama, está espalhado o conteúdo da mala.

Deixa-se prender, sem oferecer resistência.

A Mona Lisa é levada à Uffizi sob proteção policial.

Consciente do significado de sua descoberta, então, Poggi telefona não apenas para o ministro da Cultura Corrado Ricci, em Roma, e para o embaixador francês, Camille Barrère.

Pede também que transfiram suas ligações para o rei Vittorio Emmanuele III e o papa Pio X.

No parlamento italiano, dois deputados trocavam socos quando alguém entrou em plenário e gritou: ‘ La Gioconda ha trovato!’ Acharam a Mona Lisa!

O recado foi entendido.

No mesmo instante os dois lutadores abraçaram-se e beijam-se de tanto entusiasmo.

Desse minuto em diante a Itália inteira entrou na febre da Mona Lisa.

E Leonardo ?

Leonardo chamava-se Vicenzo Peruggia, tinha trinta e dois anos e, nos tempos do roubo, trabalhava como assistente de vidraceiro no Louvre.

Tinha colocado a Mona Lisa nas controversas molduras de vidro.

E como a pôs ali, sabia também como retirá-la.

Fechou-se no museu à noite, tirou o quadro, embrulhou-o num pano de linho e saiu do Louvre pela manhã; os guardas que o conheciam bem, cumprimentaram-no.

Foi totalmente absurdo.

A polícia tirou impressões digitais de todo o mundo, de cada faxineira, de cada historiador de arte e de cada arquivista para pegar o ladrão, que deixara vestígios nas molduras do quadro.

Mas se esqueceram do assistente de vidraceiro Vincenzo Peruggia.

Como foi feito com todos os funcionários do Louvre, a policia até o visitara em casa, um quarto pobre no 5, Rue L’Hôspital Saint Louis à procura da Mona Lisa.

Mas os policiais não olharam embaixo da cama.

Durante dois anos, ali, a um quilometro em linha reta do Louvre, repousou a mais procurada obra de arte do mundo.

A história foi um choque para o Louvre e para a polícia parisiense.

Ao mesmo tempo, porém, foi a maior e mais animadora mensagem de Natal.

Peruggia recebeu, na cela da prisão, inúmeras cartas de gratidão, doces e presentes de italianos agradecidos.

Em 13 de dezembro, funcionários do governo francês e historiadores da arte já estavam em Florença para examinar a autenticidade da Mona Lisa.

O ministro da Cultura italiano, Ricci, pronunciou as belas palavras: ‘Meu maior desejo é que os franceses classifiquem o quadro como falso e a Mona Lisa, assim, permaneça na Itália.’

Mas os franceses também classificaram o quadro sendo original.

Alfredo Geri recebeu uma recompensa do Louvre e uma roseta da Legião de Honra.

Leonardo, também conhecido por Vicenzo Peruggia, foi condenado a sete meses de prisão.

Em 14 de dezembro, vigiada por uma singular guarda de honra internacional, composta por gendarmes e carabinieri em uniformes de desfile militar, a Mona Lisa é exibida na Uffizi; numa moldura dourada pomposa, feita de madeira de nogueira, foi levada pelos corredores como numa procissão.

Trinta mil pessoas foram vê-la, as crianças italianas tiveram um dia livre para viajar até Florença e admirar aquela relíquia internacional.

Em 20 de dezembro, então, o quadro foi levado a Roma para o rei Vittorio Emmanuele III, num vagão de luxo, cheio de convidados de honra.

Num ato simbólico, o rei entregou-o no dia seguinte, no Palazzo Franese, à embaixada francesa.

No Natal de 1913, o quadro ainda foi exposto uma vez na Vila Borghese – o próprio ministro da Cultura, Ricci, ficou sentado ao lado do quadro, durante o horário de abertura; prometeu não tirar os olhos dele nem por um segundo.

De madrugada, uma dúzia de policiais tomavam conta da pintura.

Então a Mona Lisa foi levada num vagão de luxo para Milão – lá o quadro pode ser visto por dois dias no museu Brera, sob fortes medidas de segurança.

A passagem de Mona Lisa pela Itália foi um cortejo triunfal sem par.

Por onde o vagão passava, as pessoas jubilavam e acenavam.

De Milão, a Mona Lisa cruzou a fronteira francesa.

Deixara o Louvre como pintura e retornava como um mistério.”

Texto extraído do livro: “1913 – Antes da Tempestade” de Florian Illies, estudou História da Arte e História Contemporânea em Bonn e Oxford, atualmente é proprietário de uma casa de leilões em Berlim.

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