Uma das obras mais valiosas e frágeis da National Gallery de Londres, o célebre esboço é constituído por oito folhas de papel pegadas umas às outras, feito em tamanho natural, como desenho preparatório para ser passado para quadro ou parede. Considera-se que nunca foi utilizado com essa finalidade porque os contornos das figuras não estão nem calcados nem furados.
A insólita iconografia nasce da união de dois temas muito comuns na pintura florentina do século 15: Nossa Senhora com o Menino e Santa Ana e Nossa Senhora com o Menino e São João. A composição resulta extremamente complexa, fruto do estreito enlace das personagens que se sobrepõe até formar uma estrutura piramidal de formas concatenadas.
Apesar de se tratar de um desenho, o sfumato resulta ainda mais surpreendente e significativo da poética de Leonardo pelos seus efeitos atmosféricos e emocionais do que as obras pintadas em cores. Em 1962, o papel foi rasgado com uma facada de um turista e novamente danificado em 1987 por um desequilibrado que disparou contra ele um tiro de pistola.
Entre os principais conselhos que Leonardo da Vinci deu aos artistas foi importantíssima a advertência de que “o desenho dos membros não seja demasiado acabado”. A poética do mestre reconhece no esboço e no apontamento – atos para “despertar o engenho para novas invenções” – momentos criativos primários dotados de valor autônomo.
As duas mulheres sorriem maternalmente e quase se fundem numa figura única, plasmadas pelas relações em claro-escuro cuidadosamente investigadas. Algumas partes, como o antebraço de Santa Ana, erguido para testemunhar a sacralidade da cena e a zona inferior, foram deixadas por acabar, por resolver, e testemunham contínuo e incessante trabalho gráfico de Leonardo, a sua dificuldade em levar a cabo projetos por tantas vezes modificados e retomados.
O Menino afasta-se dos braços da Mãe e lança-se na direção de São João para o abençoar; o gesto com o braço estendido em diagonal segue o andamento transversal das outras figuras e preanuncia o Batismo. As poses e os gestos das personagens enlaçam-se reciprocamente num ritmo compositivo fluído e harmonioso.
Este módulo compositivo piramidal será de fundamental importância na arte de todo o século 16, a partir de Rafael até os maneiristas.
![](https://i0.wp.com/www.historiadasartes.com/wp-content/uploads/2017/11/m_LeonardoDaVinciVirgemMeninoSantana.jpg?resize=476%2C640)
Agora que você sabe mais detalhes sobre esse quadro de Leonardo do Vinci, experimente fazer uma releitura dele ou criar um grupo familiar que estabeleça conexão entre gerações, usando o material colorido que mais gostar.
Fotografe seu trabalho e compartilhe sua experiência conosco, nas redes sociais, usando a #historiadasartestalento
Vi esse maravilhoso desenho em 1975, na National Galery, em Londres. Tão profunda foi a marca que ele me deixou que hoje, passados 47 anos, sua magnitude me faz sentir como se ainda o estivesse vendo. Rio de Janeiro, 19 de setembro de 2022.
Olá, Georgina, agradecemos seu emocionante comentário e continue aproveitando nossos artigos. Abraço